"Os verdadeiros progressistas são os que partem de um profundo respeito ao passado. "( Joseph Ernest Renan )

terça-feira, 8 de novembro de 2011

A Consciência Organizativa por Clodomir Morais (*)

Ex-organizador das Ligas Camponesas, ex-deputado e ex-exilado político, Clodomir Moraes foi homenageado por Lula e Dilma
Nas semanas que se seguiram à injusta derrota imposta por Collor a Lula, o Partido dos Trabalhadores ficou atônito e, naturalmente, defraudado. Seus dirigentes procuraram imediatamente dar ao que se denomina, em xadrez, “o xeque da raiva”, anunciando a instauração de um governo “paralelo”, e nomeando seus ministros.


A pasta da Educação tocou ao ex-reitor da Universidade de Brasília (UnB), Cristovam Buarque. Ele, com enorme entusiasmo, tratou de difundir os alinhamentos de seu Plano Nacional de Educação. Para tanto, convidou colegas, alunos e amigos a uma reunião no auditório da Faculdade da Direito da UnB.

A convocatória foi decepcionante, já que os convidados não passaram de meia dúzia, entre eles um economista do IPEA, que Cristóvam apresentou como futuro titular e Pasta de Planejamento, e o ilustre baiano Bautista Vidal, pai do “dendiesel”, que ocuparia a pasta de ministro da Ciência e Tecnologia.

Depois de meia hora de espera, o professor Cristovam Buarque tomou a palavra e explicou, em linhas gerais, o seu plano Nacional de Educação, com sua proverbial eloqüência aliada à sua capacidade – dir-se-ia “darcy-ribeiriana” de criar idéias novas.

Por não dispor da platéia desejada, a reunião durou apenas meia hora tempo suficiente para o conferencista explicar resumidamente as linhas mestras do Plano de Educação, que, no seu entender, seria o “carro-chefe” do “governo paralelo” do PT.

O fracasso da convocatória inibiu os interlocutores e estes de limitaram a perguntas sobre o plano e nenhuma sobre o Governo Paralelo.

Apesar de algum colega achar bisonho esse tipo de governo proposto, eu o enalteci, desde que não ficasse limitado à esfera federal de uma dúzia de ministros, mas, ao contrário, que essa estrutura administrativa do PT fosse decalcada nos Estados e municípios.

Ora, se o PT derrotado criasse governos paralelos nos níveis federal, estadual e municipal, o partido teria submetido, pelo menos, sessenta mil dos seus militantes, em todo o nosso país, à experiência rela de estudo, proselitismo político e da prática da administração, durante todo um quadriênio. Teria sido a estruturação de uma enorme e complexa andaimaria político-organizativa com que o PT estaria pronto para vencer a eleição presidencial seguinte.

Essa idéia, porém, teve a menor simpatia e nenhuma, não obstante muitos dos dirigentes terem claro que essa dimensão de sua prática real de “atividade objetivada”, em dimensão nacional, estadual e municipal, seria a forma mais eficiente de capacitar o “sujeito-social”, o partido, e concomitantemente seus militantes.

Daí que o “Governo Paralelo” foi morto e sepultado no seu nascedouro, pelo fato de se afigurar demasiado complexo para dirigentes e dirigidos do partido.

Ambos, partidos e partidários, em linguagem “freiriana”, já haviam transcendido a “consciência critica”, caracterizada pelo questionamento, e o protesto como norma e como catarse.

Este rumo à oposição sistemática, à intolerância, à crítica pela crítica, servia apenas para retardar o surgimento da “Consciência Organizativa”. Nisso residia a incapacidade de viabilizar seu jornal diário orientador dos militantes, não obstante poder contar com anúncios de prefeituras arquimilionárias como as de São Paulo, as do ABCD, as do Rio de Janeiro, Porto Alegre, Santos, Campinas etc etc.

Para a oposição mexicana pôr baixo o monopólio do setuagenário e poderoso PRI, a pequena-burguesia intelectual, durante em década, jogou nas bancas de jornais de todo o país quatro diários: Uno más Uno, Milenio, Financeiro, La Jornada.

Aqui os petistas não puderam editar além de um semanário, o de Plínio de Arruda Sampaio, Correio da Cidadania, de apenas uma dúzia de páginas.

Como para os petistas tudo começou com Lula, poucos sabem que o PC de Prestes, mesmo proscrito, editou regularmente seis diários durante oito anos: o Tribuna de Porto Alegre, o Hoje de São Paulo, o Tribuna Popular do Rio, o Momento de Salvador, Folha do Povo de Recife, e o Democrata de Fortaleza.

É a aversão que os “desclassados”, os da “galera”, os da produção individual familiar e os artesãos em geral manifestam contra complexas estruturas de produção e atividades sociais.

Sempre preferem girar tão somente em torno do individualismo, do líder. Constatou-se essa aversão no episódio do “natimorto” “Governo Paralelo” e na incapacidade dos petistas repetirem as sagas dos jornalistas Assis Chateaubriand e Samuel Wainer.

A mais eloqüente constatação dessa ojeriza à estrutura complexa de organização reapareceu na semana seguinte à posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Dado que o seu discurso de posse suscitava o medo de intervenção gringa, alguns estudantes, operários e funcionários públicos de Ji-Paraná, a cidade industrial de Rondônia, elaboraram um manifesto de criação de Comitês de Defesa do Governo Lula, Codegol, que deveriam ser organizados em cada município, bairro e povoado de todo o país.

Esta iniciativa também morreu no nascedouro, pois nem mesmo o prefeito petista da maior cidade industrial de Rondônia, Ji-Paraná quis encabeçar a lista de adesões àquele manifesto.

Era a psicossocial alergia às estruturas organizativas complexas e de dimensões nacionais. Para esse tipo de alérgicos basta o individuo nada de organização.

Dessa arte, o Lula vai ser reeleito, (apesar do partido), quanta vezes queira.

(*)Clodomir Morais,80,PHD em Sociologia da Organização pela Universidade de Rostock, Alemanha. Durante 20 anos foi consultor de Agencias da ONU. Atualmente colabora com Departamento de Sociologia da Universidade Federal de Rondônia, UNIR.

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